sábado, 8 de dezembro de 2007

Sobre jardineiros e borboletas

Minhas unhas compridas e sujas e a barba por fazer são prova cabal de que tenho dedicado mais tempo a correr atrás das borboletas que cuidando do meu próprio jardim.

Um esforço sabidamente inútil, uma vez que invariavelmente elas avoam-se embora sem ao menos agradecer a atenção dispensada, talvez julgando-a uma atenção não requisitada, ou talvez pelo simples fato de que borboletas não sabem falar tão bem quanto voar.

Assim sendo, como comunicariam tais intrincados sentimentos e emoções? Possivelmente com as asas, voejando ao nosso redor em uma coreografia cujo significado nos fosse, atávica ou inconscientemente, peculiar. Talvez – e é nisso que acredito com mais firmeza – através do olhar.

Decifrar porém, nos milhares de olhos de uma borboleta o significado específico do olhar a nós dirigido é indubitavelmente uma tarefa inglória. O duplo risco de intencional ubiqüidade e erro ou incapacidade de interpretação é suficientemente desanimador para a maioria daqueles que alguma vez tenham se dedicado à tarefa.

Incapacidade interpretativa aliás, deve ser o mal de que padeço, uma vez que enxergo sempre no olhar de minhas borboletas uma luz ou promessa que as atitudes teimam em desmentir.

Mas minhas unhas compridas e sujas e minha barba por fazer podem muito bem ser o registro, inscrito em meu próprio corpo, de que nada mais tenho feito na vida do que trabalhar em meu jardim.

Talvez isso seja o que me deu a oportunidade de observar tão de perto os olhos de tantas borboletas, ao mesmo tempo em que impediu-me de capturar qualquer uma, posto que a preparação do jardim para aquela que prefira voluntariamente pousar em minhas mãos sempre foi a tarefa mais urgente.

Talvez assim se possa dizer que o problema reside mais nos olhos da borboleta que no jardim de que até bem pouco tempo eu costumava me orgulhar.

E embora a solidão do quarto branco não sirva como testemunha fidedigna, eu sei com que desesperada convicção tento me aferrar a tal idéia na imensidão fria de mais esta madrugada.

Afinal de contas, para que servem os malditos milhares de olhos de uma borboleta que não sabe ler?



Observação: Eu sei que as borboletas não tem milhares de olhos, e sim um par de olhos compostos chamados omatídeos. Mas azar.



Paulo Eduardo de Freitas Maciel de Souza y Gonçalves

45 comentários:

Flávia Valente disse...

cara, vc escreve tão bem, que mesmo com um tema surrado e palavrório labiríntico, consegue prender a atenção do leitor até o final (e fazer com que este queira ler mais)

enfim, ducaralho!

Alana disse...

azar msmo, a liberdade poética nos permite tudoo

tá fodástico o teu texto, dá p ter várias interpretações, e a q eu tive me fez pensar numa coisa q eu ainda não tinha pensado....Isso já vale horrores
Bjooo

André Luis Rosa e Silva disse...

mais um blog para cambiarmos el mundo!
longa vida, escreva, e coloque os instantâneos do samba entre seus links.
abraços
!

Unknown disse...

Talvez assim se possa dizer que o problema reside mais nos olhos da borboleta que no jardim de que até bem pouco tempo eu costumava me orgulhar.


olha cara parabéns...mto bom o texto...vale a pena...

Abraço

jxrwnxx

Unknown disse...

Paulão, seu texto é complexo, sinuoso e ágil. Você escreve pelos cotovelos. Você é 10, 1000 e sabe dizer as coisas da forma mais simples possível. Abraço.

Paula Freitas disse...

É com fidedigna sinceridade que comento: as borboletas são esquisitofrênicas. Risos.

Anônimo disse...

E embora a solidão do quarto branco não sirva como testemunha fidedigna, eu sei com que desesperada convicção tento me aferrar a tal idéia na imensidão fria de mais esta madrugada.

Afinal de contas, para que servem os malditos milhares de olhos de uma borboleta que não sabe ler?




Forte.

Unknown disse...

gostei do texto, mas não sei o que comentar

Anônimo disse...

Paulinho, Paulão, Paulones... Após ler esse texto praticamente obrigada (sacrifício de aniversário) no fim... Acabei por gostar dele, e ficar aqui viajando em meus pensamentos a respeito de milhares de olhos (até imaginei uma boboleta gigante sendo perseguida por você de barba extremamente cumprinda e unhas alá palheta.. ) Ta viajei um pouco além do surreal! hauahauha Mas ué? Poesia é assim não é? como você mesmo disse "mas azar".
Gostei das colocações e do jogo de palavras!

Paulinho Maluco com fardo cheio de balas!
Feliz Aniversário!


Lolo Melamed

BANDO DA LEITURA disse...

li não sei onde:
"se gosta de borboletas cuida do teu jardim"

Bom o que escreveu,mesmo tomara que a nova idade continue lhe trazendo inspirações.
aliás poemas são jardins, o escritor jardineiro por isso está sempre preparado para novas sementes.
As borboletas seriam nós leitores que enxergam além dos olhos e do olhar!!

Anônimo disse...

Meus olhos colaram nesse texto. Fui sugada pra dentro dele. Focos variáveis e indiscutíveis. Feliz Aniversário!

Poison Ivy disse...

Nossa...quanta borboleta comentando aqui!!!

Alguem vai sair daqui com a asa quebrada...ui...sufocooooo!!!

E os omatídeos...não fossem eles...ah...as redes seriam talvez mais ágeis...

Se precisar, eu te empresto (LEIA-SE BEM...TE EMPRESTO...) um cortador de unhas!

Cruzes...credos...deixa eu ir lá ver meu jardim depois dessa, viu!

Valderez disse...

Belo texto...
Mas acho q vc deveria cortar as unhas
=p

Anônimo disse...

Essas borboletas safadas...
Eu sabia, eu sabia!

Anônimo disse...

Será que uma semi-puta pode invadir assim o espaço de um semi-deus?
Bom, garfos daqui, harpas dali, teu texto é espetacular. Mas meu pavor da tua ira celestial me faz ficar anônima.
kkkkk

Anônimo disse...

Inda não tinha lido estórias de borboletas q não sabem ler... só das q não sabem contar! (verdade)

bjs!

Ruy Villani disse...

Paulão
Sei lá se a mensagem anterior passou. Te disse que sou seu fã, e que você me surpreende a cada novo texto.
Também te deixei um abraço pelo aniversário.

Anônimo disse...

mto bommm
qm sabe ensina-las a ler??
huum?
parabéns
pelo a niversario e pelo texto
bjoo

Bruninha disse...

Belo texto, que todos saibam cuidar de seus jardins para que borboletas pousem e de lá seu lar transformar!

Parabéns mais uma vez...
Além do seu dia, pelo singelo e belo texto!

abraços!

Anônimo disse...

Você tem um futuro promissor!

J. disse...

ah,precisa ensinar as borboletas q não serão presas pelas suas unhas... rs

javAlisson disse...

Caralho Sr. Fardadão, quantos comentários!!!

Nunca vi um texto tão lírico vindo de um cara tão escatológico! Parabéns Fardadão, você é um cara versatil, curto isso!

Abraços!

E Feliz Aniversário!!! HUhaua

Unknown disse...

tu é uma barbuleta.

Maria Júlia Pontes disse...

paulo, agora que soube que era vc no meu MSn, he,he
Cara, esse conto de borboletas está extravagantemente absurdo de bom, eu fiz um poema "Asas de Borboletas" tá no bar.
vc escreveu de forma tão sublime que fiquei pregada no texto do começo ao fim
Belíssimo.
mj

Carlos Cruz disse...

Fardado, seu texto só acrescenta e avoluma o que eu já estava careca de saber: você escreve bem para caralho! Acho que este é o mais lírico que li até hoje.
No ensejo, renovo protestos de elevada estima e distinta consideração.

Paulo Castro disse...

Engraçado, cara.
O sujeito de unhas sujas e barba por fazer, me pareceu ser uma espécie de borboleta, ira borboleta, esperando o silêncio cruel e de gozo, da metamorfose, ou mutação.
Abraços.
E hoje:
http://nalatadopoeta.blogspot.com
°

Anônimo disse...

Eu acho que borboletas sao fofas.

ReWiLL disse...

Parabéns cara! Vc escreve muuuito bem (:

passa la no meu tb!
http://rewillian.blogspot.com/

Leo disse...

As borboletas são opressoras.

Com a ditadura da beleza delas, matam a lagarta dentro de cada um de nós.

Decepciono-me em observar como a maioria não vê isto, e como este texto é lacônico em realação a verdadeira atuação das borboletas em nossas vidas.

A maioria que aqui escreve não deveria ter o direito de se posicionar a favor ou contra as borboletas pq, com certeza, ninguém daqui sabe voar.

Paradoxalmente, todos já se rastejaram como as lagartas que ora desprezam... Reflitam nisto.

Anônimo disse...

O Texto está excelente, parabéns!
Acho que você escreveu borboletas para disvirtuar um pouco a leitura geral, não sei a que nome dá nisso, mas já vi bons escritores o fazerem.
Gostei muito de ler e me deliciar com vários pensamentos que tive!
Como você disse em meu blog, quando o texto é bom, levanto-me e bato palmas!

Homer Simpson disse...

Legal o texto

Parabéns pelo blog,está bastante interessante!!

Sane Almeida disse...

Você tem a CASCA de uma pessoa agressiva.
Prendeu minha atenção,
"Incapacidade interpretativa aliás, deve ser o mal de que padeço, uma vez que enxergo sempre no olhar de minhas borboletas uma luz ou promessa que as atitudes teimam em desmentir."

ME IDENTIFIQUEI.

***
Sobre os vídeos de shakespeare, que amo de paixão, fiquei triste, só sei o básico da antiga 5ª série de inglês. :/

Mas que se dane o Inglês tb, não é por isso que correrei atrás de saber!

Inté.

Edi disse...

Adorei o texto, tava bem inspirado hein!!!! os olhos de borboletas te fizeram refletir msm... rsrs

Astréia disse...

Como vc mesmo disse: "Incapacidade interpretativa aliás, deve ser o mal de que padeço".

Escorpiana disse...

Você escreve muito bem... parabéns

Publicidade Esportiva disse...

Parabénsssss

Como sempre ótimos textos...

Abraçossssss

Anônimo disse...

Que borboleta hein? hehe
Abç

Simply disse...

Não quero deixar um comentário vazio.
Mas, com as voltas que o texto deu eu estou até agora tonto, e tá difícil achar a saída.
Não entendi eu confesso, mas não posso negar que está muito bem escrito.
Não concordo com a maioria, e se serve de consolo, dizem que a unanimidade é burra, então tá qui o meu discordo.

abs

Anônimo disse...

Esse comentário aí de cima q é massa! "Não entendi nada, mas discordo veementemente!"

Dani disse...

parabéns vc escreve muito bem, o texto está ´timo, culto, reflexivo.
até mais,

Sour Cherry disse...

Confesso que à princípio estava achando rudimentar, mas à patir do 2° trecho vai criando ''vida'' e dá espaço pra diversas interpretações. Parabéns.

Beijos

http://ponto-d-equilibrio.blogspot.com/

William Dutra disse...

Seu texto é incrivel...

são poucos textos que me dão vontade de ler até o final...

parabens

Verdelone disse...

É preciso ler diversas vezes para realmente sentir o que quer dizer o texto. É preciso entrar na alma do autor....
Cia dos Botecos www.ciadosbotecos.blogspot.com

FabioZen disse...

Olha não gostei muito da temática não.Mas não dá para negar seu talento com as letras.Parabens!

Uvirgilio disse...

Eu já tinha visitado o seu blog, algumas vezes, mas só agora dcidi segui-lo, acho que por causa da postagem, os jardins e as borboletas que são usadas em sentido figurado, me amarrei nesse texto. Ah e adorei o seu comentário no meu blog, bem diferente dos outros, mas engraçado.