sábado, 14 de junho de 2008

Gatícia

Meu maior interesse na cidade nova era a gatinha da casa ao lado, que praticamente toda noite aparecia em minha porta.


Egoísta e egocêntrica, suas conversas resumiam-se a um “eu, eu, eu” incessante, replicadas por “eu, eu, eu” da minha parte. De birra, acabava por oferecer aquilo que ela inconscientemente almejava.


Com esta fêmea, pode-se dizer que exerci o charme mais habilidoso, conforme o aconselhado por especialistas na área. Dentro de algum tempo ela já comia em minha mão, embora certos atrevimentos tomados me tenham rendido algumas feridas, nem grandes, nem incômodas.


Pequenas janelas. Rasgos através dos quais enxergo dentro de mim. Por baixo da pele, uma segunda pele, mais macia, mais sensível, e de aspecto seguramente desagradável. Uma carne da qual também sou feito, por custoso que seja admitir.


Mais correto talvez fosse livrar-me do vício em remexer antigas feridas – cujo conteúdo escancaradamente repulsivo seria por si só motivo de evitá-las – ainda que o cuidado em remover apenas carne morta não acarrete dor alguma.


Creio ser por isso que hoje sinto tanta saudade da gatinha da casa ao lado, manhosa e interesseiramente enlaçando-se em minhas pernas, jovem e inocente demais para causar grandes estragos.


Paulo Eduardo de Freitas Maciel de Souza y Gonçalves

5 comentários:

Carla Abreu disse...

Fazer o quê se vc escreve bem d+ né?

Muito gostado!

BjO!

Anônimo disse...

eu gosto qndo eles ronronam...
ruon....ruon...ruom...
irresistivel

Unknown disse...

"Poeta bom, meu bem, poeta morto"

Bom...

blog disse...

Falta substância, densidade - eu acho. O que não significa que seja de todo ruim.
Mas há talento em progresso.
Continue, camarada.

Se quiser, visite:

www.movieantiqua.blogspot.com

Abraço.

Anônimo disse...

O que fazemos levemente perdura alegremente na memória.