Já faz algum tempo que percebi que a chave da transcendência é imaginar o inimaginável. Claro que isso é impossível, há um paradoxo intrínseco à proposição. Mas como vem sendo insinuado desde a aurora da humanidade, de vez em sempre a grande recompensa em uma jornada é o caminho percorrido, não o destino a que se chega.
Neste caso específico, isto significaria que o exercício de tentar imaginar o inimaginável é mais importante que a resposta a ser alcançada através de sua prática. Isso porque tal "técnica" nos induz a um estado mental similar ao de "mente vazia" considerado ideal por espadachins e duelistas em geral, quando no desempenho de funções e/ou hobbies.
Ao que parece, o efeito para o praticante é uma liberação da consciência, permitindo que corpo e mente ajam simultaneamente, sem interferências de qualquer ordem. No dia a dia, sua utilidade seria especialmente sentida em coletivos lotados, onde invariavelmente um infeliz - no mais das vezes estudante - se coloca às minhas costas com uma mochila aos ombros.
Apenas quando a sabedoria e engenho acumulados por nossa civilização atingissem um grau tal que nos permitisse a invenção de um transcendenciômetro, poderíamos talvez vislumbrar a magnitude do processo por que passa um indivíduo que, corpo e mente funcionando em perfeita sintonia, menos do que apercebendo-se que o corpo humano é similar a uma pirâmide invertida - com o tronco ocupando volume significativamente maior do que as pernas - instintivamente transferisse seu fardo das costas para a mão, minimizando assim o óbvio desconforto que a sua parca percepção tem por efeito causar àqueles a sua volta.
Um cidadão razoável certamente poderia tentar acelerar o evento, verbalmente comunicando a situação ao ser atravancante. Eu porém, sigo os preceitos milenares de antiqüíssimas civilizações orientais, as quais, mui corretamente, nos legaram o popular adágio: "uma cotovelada na nuca vale mais que mil palavras".
Paulo Eduardo de Freitas Maciel de Souza y Gonçalves
Texto originalmente postado aqui: http://nossogarfodecadadia.blogspot.com/2006_08_06_archive.html